Ninguém compra sustentabilidade!

A semana passada perguntaram-me: “como vejo o futuro da moda sustentável?”

Respondi sem rodeios: à exceção de um nicho muito específico, ninguém vai comprar um produto apenas por ser sustentável. As pessoas não compram sustentabilidade — compram estilo, identidade, desejo. A sustentabilidade, quando existe, é apenas a cereja no topo do bolo. O verdadeiro desafio não está em mudar os valores do consumidor, mas em transferir os benefícios da democratização da moda, conquistados pelo fast fashion, para modelos mais sustentáveis.

É exatamente isso que explica o sucesso da segunda mão. O mercado da segunda mão cresce porque oferece o que o consumidor sempre valorizou: preço acessível, variedade e conveniência. Continua a comprar barato, com a sensação de que compra melhor, e o processo é simples e imediato. Tal como no fast fashion — só que agora com um argumento moral adicional.

O relatório The State of Fashion 2025, da McKinsey e da Business of Fashion, confirma essa tendência: apesar de toda a visibilidade do tema, os consumidores mostram cada vez menos disposição para pagar mais por produtos sustentáveis. As intenções existem, mas as decisões continuam a ser guiadas pelo preço.

Podemos dizer sem medos: ninguém quer “moda sustentável”. O que as pessoas querem é moda — e se for sustentável, melhor.

É precisamente por isso que acredito que a sustentabilidade no futuro só por LEI. Se o consumidor não está disposto a pagar mais por ela, terão de ser as marcas a integrar a sustentabilidade por obrigação — não por opção. É aqui que entra a Responsabilidade Alargada do Produtor (RAP), recentemente aprovada pela Comissão Europeia. A partir dela, quem coloca produtos no mercado terá de cumprir requisitos de eco-modelação, incorporando percentagens de matéria-prima reciclada, garantindo durabilidade e certificações ambientais e sociais.

Os mercados europeus mais maduros já provaram que o consumidor não consegue absorver todo o volume reutilizável. Por isso, a nova legislação coloca um foco claro na triagem para reutilização e reciclagem, em especial na reciclagem de fibras em novas fibras.

É nesse contexto que o piloto de triagem da Lipor se torna um marco para Portugal: é a primeira triagem nacional verdadeiramente focada em reciclar e valorizar o material têxtil como matéria-prima. Com 14 saídas distintas, o modelo da Lipor representa um avanço estrutural — deixa de ver o resíduo como roupa usada e começa a tratá-lo como recurso para o futuro. 

No futuro, o vestuário terá incorporado uma percentagem de resíduo têxtil — sem que isso seja um argumento de venda. A lei fará aquilo que o consumo não fez: tornar a sustentabilidade inevitável.

Joana

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